DramaFobia
Ana Mazzei
DramaFobia
Ana Mazzei
HETEROTOPIA DO MEDO
por Roberto Alvim
[NOTA:
como Virgílio guiou Dante em sua jornada
desenho aqui esta cartografia-cênica
que deve ser lida sobretudo como um convite
para que trilhemos as veredas do lugar-outro
construído por Ana Mazzei]
PRÓLOGO
era uma vez um menino
e aquele menino guardava um desejo profundo em seu coração:
desejava não apenas viver
mas encontrar seu destino.
seu destino, ele sentia
estava escondido atrás de uma porta –
imensa, gigantesca porta.
o menino então foi ao encontro da porta:
saiu de sua casa
abandonou a segurança de seu lar
e caminhou rumo àquela porta sonhada
atrás da qual seu destino esperava por ele.
depois de muito procurar
encontrou a porta gigantesca
mas havia um guarda à frente...
como o guarda permaneceu em silêncio
o menino decidiu se calar também
e esperar que a porta se abrisse
ou que o guarda o convidasse a entrar.
assim, o menino sentou-se em uma pedra
e esperou ali
em silêncio.
horas se passaram
e as horas se tornaram dias
e os dias se tornaram meses, anos
décadas...
o menino
(agora um velho)
permaneceu sentado em silêncio diante da porta gigantesca
por todo o tempo de sua vida.
um dia, aquele velho
que outrora fora um menino em busca de seu destino
sentiu que as forças lhe faltavam
e que a morte estava muito, muito próxima;
reunindo um último fôlego
o velho criou coragem e dirigiu-se ao guarda
pela primeira vez em todo o seu tempo de espera:
“senhor?
perdão por incomodá-lo, mas...
a porta, esta porta:
quando vai abrir?”
o guarda olhou para o velho, sem entender a pergunta
mas o velho insistiu:
“por favor, preciso de uma resposta...
espero aqui há tanto tempo....
esta porta, atrás da qual meu destino me espera;
quando estará aberta?"
o guarda, então, sorriu
e falou com uma voz carregada de ternura:
“esta porta?
está aberta...
esta porta?
sempre esteve aberta, sempre aberta:
pra você.”
mas antes que pudesse terminar de dizer estas palavras
o guarda percebeu que o velho
já não respirava mais.
I ATO
o palco – lugar da AÇÃO (DRAMA em grego)
habitado por
OBJETOS-DESEJANTES:
nos exigindo
suplicando
implorando
por ACOPLAMENTOS NÃO-NORMATIZADOS.
só assim estes das ding serão ATIVADOS:
dependem de nós para descobrirem seu sentido
- mas seu sentido é semelhante ao de máquinas-esquizofrênicas
que FUNCIONAM
ainda que não sirvam para nada...
(e é assim que se irmanam à própria estrutura da VIDA)
como um CAVALO DE PAU:
galopá-lo
e ir ao encontro
do destino
como o OLHO DE DEUS:
perceba – a onisciência
é sempre
instável
INTERMEZZO
aqui
(nesta interzona):
o lugar da FALA
falar para:
1 - encobrir nossa nudez
2 - mascarar nosso isolamento
3 - eclipsar a devastação que nos consome
4 - inventar a nós mesmos
EU FALO : EU EXISTO
(se
e somente se
no ato da fala
você perceber o FURO
então penetre por ele
e siga para a próxima cena)
II ATO
no cenário
duas sombras
(posto que este é seu território)
conversam em silêncio:
SOMBRA 1.
o medo
você compreende?
o medo
não tem
objeto
SOMBRA 2.
o medo? não
está errado tão tão errado
o medo tem sim o medo sempre teve sempre terá seu próprioespecífico objeto
SOMBRA 1.
o medo?
(a Sombra 2 sorri)
SOMBRA 2.
sim: o medo só pode existir
se o-Objeto
existe
(então a Sombra 2
invoca
o-Objeto)
em um Portal:
Kthulu
(o-Objeto-ausente)
em outro Portal:
sua vítima
(eu-você?)
EPÍLOGO
aqui
agora
em seu espaço mental
(na escuridão de si mesmo)
o PRÓLOGO é a morte-em-vida
o I ATO é a chance de mergulhar
no INTERMEZZO:
hora de aprender a nadar
e no
II ATO
você
se
afoga